Wednesday, April 29, 2009

trecho aos que não enxergam o que veem

escrever é como dedilhar em meus olhos o que não consegues enxergar

escrevo, então, ainda que não leias. ainda que tenhas uma grande e indelicada alma, onde não lês a brandura dos braços que abro e que comemoram - comemoram a sutileza do que não se sabe; um não-saber tão sensível que palpável. e ao passo que escrevo, intento dizer-te, dizer-lhe, dizer-vos, dizer-lhes o que não enxergam. o que olham, distraídos, desfocados.
os fracos deslizes invisíveis e indizíveis a olho nu, os grandes descompassos, as voltas, as idas, as memórias: não se enxerga a grandeza d'alma. e aos que escrevo, deslizo, descompasso tão inerte que quase me esqueço. escrevo indo, escrevo o que volta, escrevo o que hoje é tão cheio de passado...o que não se pode lançar.
escrevo ainda que convicta, ainda que tensa, ainda que fraca, ainda que solta, ainda que mágica, ainda que viva, ainda que caia; escrevo por que não leem-me os olhos - leem o que digo; escrevo porque não gravito onde pertenço, e preenchida de mim, escondo a intensa parte de quem vive.
escrevo para pousar o signo da leveza que hoje em mim se integra. pouso e me codifico em pequenas palavras e versos calejados. codifico o que não se ouve

Saturday, April 25, 2009

de tempos

os dias passam e encontro de manhã os mesmos tons do quarto
da tinta, do corpo
vão passando as horas e quase conserto o que não tem conserto
ainda que desconcerte

já quase sem cantar, parei de citar vírgulas
e de vivê-las parei também
agora dei para terminar o interminável
pular a linha
findar a frase
a noite
o sono

o tempo vem passando numa tolerância intragável
num conforto curioso
sem dor ou riso
e hoje
me encontro cada vez mais em tudo que desencontro...

negação

batem a porta
mãos
e pernas
e braços
e troncos
e pêlos
e poros

não quero ouvir
não toco
desfoco

não despejo
desejo

passo
suave
onde encontro
passagem

Thursday, April 23, 2009

escrevo em blocos
para dividir-me
em mil
ou duas

uma que parte
outra que forma
(disforma
transforma
reforma
informa
deforma
...)

goteira

uma gota
sedenta
não me mata a sede
que sacia-se
no gole
que engole
o que suspensa
anseio

retomo então
no verso do gole
que engole a gota
que não corre
escorre
...
a suavidade

Wednesday, April 22, 2009

ruas viadutos e avenidas

Você ouve então que 50% da nossa população vem mostrar-se em cima ou abaixo da linha da miséria. E vem a ouvir também que esses, esses mesmos, não tem condição de sequer admitir a possibilidade de absorver a vida, ou de poder absorver o mínimo de conhecimento necessário para poder vivê-la descentemente: com comida, moradia, saneamento básico, respeito, dignidade. isso é o básico. tudo isso é básico.
Sem resposta, você nada diz, nada faz, assim como eu, que não faço idéia do que, aos meus 17 anos, posso fazer além de me lamentar em linhas que mal escrevo, por que não costumo escrever sobre isso - assim como todos nós, todos que nessa imensidão calam diante da fraqueza do nosso governo, da miséria que nos assola, que cala diante dos impostos, do comodismo, da retribuição que se eleva a zero, e senta então, sorrindo em frente as cores da tv brasileira.
Mas eu venho e lhe digo que os outros porcento, estes que estudam em escolas privadas como eu, que vêem - ou não - seus pais a pagar tantos impostos, esses que não destroem na escola ou na vida nenhum de seus preconceitos, ou sequer descem do patamar que lhes colocaram, de classe média, classe média alta, esses que não saciam sua sede; absorvem apenas a alienação - alienação tamanha possível nessas escolas tão intríscecas ao capitalismo que são então parte dele; que personificam em suas instituições um sistema que engole as necessidades intelectuais dos que o podem pagar, ou então o mais: cobram por uma alienação quase explícita e, caso haja, ainda, o desprezo por esse ensino, paga-se: e ao pagar tem-se a libertação da obrigatoriedade de formação intectual. paga-se e não se pensa. paga-se e aprova-se o que não pensa. ainda, paga-se e forma-se. forma-se o alienado, o pobre mais pobre que empobrece todo o nosso país: o que não pensa, o que não age, não indaga, não sustenta.

Friday, April 17, 2009

se perdendo por aí

se meu tempo não fosse
todo esse tempo que acumulo e guardo
nos dias que não ardo...

...se meu toque não cumprisse a pena
de todos os outros toques que me tocaram
...se meus olhos tivessem a leveza ingênua
para prantear o que desamam
na doçura do que não se sabe
se
se
se

vejo no seu tom meu mais famoso som
vejo na sua estrela o que prometi emudecer
e quase desejo não ter existido
para não ter o que esquecer
mas...
existo

e hoje, da ponta leste
longe do cume e do chão
admiro e entristeço meus olhos no silêncio desse tempo
que não é mais meu
e que desafino na marcha que marcho

me encontro, então
admirada,
na repetição do respiro
que expiro
sem inspirar

é uma pena...
mas não sei viver do ser que já fui
vivido
hão de haver
mais de mil composições
hão de amanhecer
tantos e tontos clarões
nos olhos que haverão
de ser
mais do que
uma simples
ilusão
a
bra
ço
t
eu
pas
so
a
pas
so

supõe

quero descobrir tudo que há pr'além do que presumo. descobrir os tons e os sons que se calam pr'aqueles que saciam-se nas suas suposições das reticências.
quero descobrir o que há pr'além do que alcançam meus braços, meus olhos, meus laços, meus passos - que caminham tão distraidamente dentro das minhas quase intermináveis exigências e expectativas...

Wednesday, April 15, 2009

ps

e escrevo pra dizer o que sinto, não o que penso. por que o penso não escrevo, discuto.
eu escrevo.
eu escrevo pra dar esperança pro que não tem conserto. escrevo pra enchargar o que é seco. escrevo pra metaforizar todos os ocos da vida e fazer do oco mais oco, o vazio mais bonito dos que se enchem.
eu escrevo pra metaforizar todos os meus sentidos e não-sentidos. todos os meus suspiros e todos as minhas respirações, simples e óbvias.
eu escrevo pra racionalizar. escrevo pra entender. escrevo enquanto ainda existem perguntas sem resposta.
mas hoje...hoje não escrevo. não escrevo porque não racionalizo. não entendo. não pergunto. não escrevo para transformar. nem indagar.
não metaforizo nada porque não há metáfora mais delicadada do que todas as inspirações que não venho tendo. meu coração quase cheio do que não escrevo seria perfeito pra qualquer construção literária se eu já não me sentisse dentro dela.
tenho tido dias lindos, acordes sutis, acordares preguiçosos, tons cianos, pensamentos macios, gosto colorido, um vazio lotado de infinito...
mas ainda assim não pretendo um poema, uma crônica; não pretendo a prosa, sonetos perfeitos, versos decassílabos, um texto sem ponto e sem vírgula que tire o fôlego. não pretendo afundar minhas palavras nas rimas mais bonitas que posso escrever...
as palavras moram comigo, moram em mim, flutuam em mim e eu venho nadando não nelas - mas em todas as suas relações. como se essas palavras que guardo e que toco se confundissem e formassem prosas tão lindas, mas tão lindas que não preciso escrevê-las. estou nelas.
a banalidade que se vive quando se vive assim, deixa qualquer banalidade incrivelmente misteriosa...

Friday, April 10, 2009

ultimo dia

sentei e não sei bem o que dizer. fico procurando em cada fio de cabelo que bagunço e arrumo, a melhor das desculpas para escrever. não sei. não acho. não tenho uma boa razão

nessa construção de uns anos e poucos - nem tantos, mas tantos para o que posso contar -, eu me apaixonei muito. me apaixonei pelas mais bonitas, as mais velhas, as mais inteligentes. eu me apaixonei por profissões incríveis, pensamentos impressionantes, vidas alucinadas, amores violentos; infinitos sorrisos e infinitas línguas, infinito intelecto e infinita beleza. infinita beleza...
o resto era resto. eu descolava bons versos e colava na testa. fácil e sutil, logo já achava que eu era a personagem das composições do chico. e haja amor pra viver composições do chico.
hoje, chico nao me traduz. neruda não me traduz. até vinicius não me traduz. o que é pensado não mostra linguagem. hoje não me pergunto sua idade, quem sao seus bons colegas, o seu passado, seus filmes preferidos, seu melhores cds, não me pergunto o que você pensa da áfrica, o que você faz p ganhar a vida, seus sonhos, seus méritos. não me interessa seu lugar. "nao me interessa saber da onde é e como veio parar aqui", quero sentir tudo isso. quero tocar o silêncio. quero descobrir novos passos. não quero saber. não quero pensar. quero sentir como sinto a música que toca o que essas cores passeiam. quero tanto que não quero nada
sinto tanto que não sei como sinto
ainda que sinta cada vez mais


nao sei se sei de tudo isso - mas é bonito

Thursday, April 09, 2009

...

minhas borboletas se misturam com um frio tão frio que congela minhas mãos ao passo que as faz tremer e desenhar...
hoje sinto o incrivel paradoxo do que arde sem se ver...que nunca tinha me ocorrido antes. tenho medo
medo por que abro. e se abro, entra; e se entra, cresce; e se cresce, toma; e se toma, arrasa; e se arrasa, estremece; e se estremece, conheço; e se anseio a possibilidade de estremecer, conhecer o que desconheço...medo. medo no frio que desenho e ando. e quando ando alguma coisa em mim voa...e ao voar me pergunto: voa pra onde?

Wednesday, April 08, 2009

faz sol lá fora..não há nada que me escreva
escrevi uma história de meia dúzia de estrofes que não gostei tanto pra postar
queria saber onde é que foi parar minha inspiração
só consigo pensar. penso ao acordar o que pensei de sonhar
e sonhando penso que acordo
e de tanto pensar não sei o que faço...

Sunday, April 05, 2009

Saturday, April 04, 2009

butterflies and hurricanes

eu tenho uma sensação e um pensamento...
um pensamento que me tranca a garganta

me ata em nós quase tão frios como quando conheci o mar
e uma curiosa sensação que me abre cem vôos de borboletas

...

pensamento vem de fora
e sensação vem de dentro?

por que assim que soa no vento a vazia possibilidade
de desatarem-me os nósl,
de tão vazia, me ato de novo
e mais borboletas desmaiam

...

é como se para sentir-te
tivesse que pensar-te
e pensar-te me tranca e me sujeita


ou como se para pensar-te
tivesse de sentir-te
e sentir-te me toma e encanta


se parto ou se nasço...

Thursday, April 02, 2009

a gente se apaixona quando e enquanto há a descoberta. descoberta - esse eufemismo pra essa busca de uma extensão mais bonita do que nossos passos, tao tímidos, cheios, surtados e cansados...passos que passo a passo desejam essa extensão tosca e linda. que toca e que lê.
se apaixona quando descobre o cheiro, se descobre o gosto. quando seu coro e sua sorte é tão admirável quanto o samba de vinicius. ou mais
a paixão permenece enquanto descobrimos novos cantos. novos cantos naquilo que não velamos, desejamos. desejamos por que ainda não velamos. enxergamos seus encantos, antes de abordar e abortar as vértices que derramarão lágrimas. lágrimas de quem não se apaixona pelo inesperado. só pelo que espera e quer. e quer mais - e só - suaves notas de violão.
seguimos cheios e entornados num gosto meio macio, meio azul ciano, indelicado de tão delicado....começamos a chamar-nos pelo som.
"que seus passos me estendam ao passo que estendem minh'alma - tão tímida. "
até que paramos o som e começamos a amar o mistério de não haver mistério algum. agora descobre-se a dois. anda-se a dois. sem extensão, mas estendidos, amamos.
ama-se o som da repetição.

e a repetição de todos os novos sons