Wednesday, March 04, 2009

O grande sofisma

"Não sou responsável pelas minhas insuficiências. Se minha corrente vital é acaso interrompida e foge de seu leito; se meu ser muitas vezes se desprende de seus suportes e se perde no vazio; se é frágil a minha composição orgânica e tênues os meus impulsos — culpo disso os meus pais, a sociedade, o regímen, os colégios; culpo as mulheres difíceis, os governos, as privações anteriores; culpo os antepassados em geral, o mau clima da minha cidade, a sífilis que veio nas naus descobridoras, a água salobra, as portas que se fecharam e os muitos "sins" que esperei e me foram negados; culpo os jesuítas e o vento sudoeste; culpo a Pedro Álvares Cabral e a Getúlio; culpo o excesso de proibições, a escassez de iodo, as viagens que não fiz, os encontros que não tive, os amigos que me faltaram e as mulheres que não me quiseram; culpo a D. João VI e ao papa; culpo à má vontade e à incompreensão geral. "A todos e a tudo eu culpo. Só não culpo a mim mesmo, que sou inocente. E ao Acaso, que é irresponsável."

Anibal Machado

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