Wednesday, October 31, 2007

grandes prazeres

"...Então comecei a namorar a Ana. Uma jornalista frustada que adorava meu jeito de dançar mesmo sabendo que eu não sabia dançar. (E ainda não sei).Eu sempre a olhei com os olhos curiosos. A cada dia que passava eu percebia uma nova pinta no corpo dela, um novo deslize, uma nova melodia pra curar o tédio dos carros que passavam em frente a nossa casa, um novo suspiro, uma novo abrigo em cada dobra do corpo, uma nova estrela no nosso namoro cinco estrelas...E deitávamos pra viver e sentir o tempo passar. Até que uma nevoa cobriu nosso céu e a gente seguiu por universos paralelos. Ela me dizia que a gente se encontraria no infinito. E eu, sem concerto, fui.Depois veio a Cintia, uma fotógrafa que se apaixonou pelos meus olhos. E como apaixonou. Ela me ensinou que a nossa tristeza era uma alegria falhada, e mais nada. E eu ensinei pra ela como era mais sensível fotografar com os olhos. Até hoje percebo que, no futuro, a sensibilidade deforma um pouco a foto que guardamos conosco. E também, eu não sei fotografar.A Cintia gostava de pintar e tentou me convencer com mil pinturas como eu fico linda dormindo. Eu acho que era pintada mais delicada do que devo ser enquanto durmo. O guache dá essa impressão...E o amor também.Mas um dia resolvi que queria ser pintada pelo resto do mundo pra poder me pintar. E, incompleta, fui...Depois delas veio a Alice e algumas outras. A Alice gostava de xuxu com cenoura e eu achava lindo o jeito que ela tinha de me olhar e me tocar. Era um prazer sublime que compartilhávamos em segredo depois de tomar frapê de chocolate enquanto rolávamos no sofá cantando 'here comes the sunnn little darling...' A Alice tinha uma alegria diária de andar do meu lado e de viver ao meu lado. De sambar em mim e pra mim, de se debruçar em mim e por mim, de gritar pra mim e por mim... Mas meu peito doeu de tanto samba e de tanto peso, e medrosa, eu fui...Então veio a Paula, que tinha as mãos pequenas e o nariz arrebitado. A Paula tinha gosto de pêssego. E era incrível como o sussurro dela me fazia tremer. Ela falava baixinho, e mais baixinho ainda quando falava pra me ver bamba. E via. Ela me tocava como se tocasse cristal. E me segurava na mesma intensidade. Até que me soltou. E eu fui...Depois vieram mais algumas que me amaram por que queriam amar. Amaram o amor, talvez. E eu ia, como sempre fui. Já sabia me pintar, continuava tentando dançar, não fotografava, ainda tremia, rolava no sofá, mas sabia ir..."

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